NESSA SEMANA O ENCONTRO DE DUAS MUZAMBINHENSES NOTÁVEIS

Gláucia Maria Vasconcellos Vale (*)

 

Muzambinho é o “pequeno país” de duas mulheres notáveis, nascidas, ambas, no ano de 1928: Helena Armond e Meiga Villas Boas Vasconcellos. Cada uma delas com um grande legado artístico, que se projetou muito além dos limites da terra natal. Na semana em que a Academia Sul Mineira de Mulheres Escritoras/ AFESMIL comemora, no circuito Poços de Caldas, Muzambinho/ Presidente Prudente, o aniversário de nascimento de Helena Armond, ocorrido em 25 de janeiro, a vida e obra das duas escritoras encontram um novo ponto de convergência.

 

Helena foi pintora, escultora, decoradora cultural, poetisa e pesquisadora. É também a Patrona da cadeira 33 da Academia Sul Mineira de Mulheres Escritoras/ AFESMIL, cuja Acadêmica Titular é Meiga Villas Boas Vasconcellos. Meiga é escritora, pintora, escultora. De comum entre elas, a capacidade de resistência e luta na superação de obstáculos e o talento para a criação. No mundo das artes, as duas ultrapassaram fronteiras de gêneros e de formas de expressão.

 

Com a idade de 10 anos, Helena mudou-se para a cidade de Presidente Prudente, onde passou a residir e veio a se casar, em 1947, com Moacyr de Oliveira, com quem teve dois filhos. Sua carreira artística é construída em São Paulo. Enquanto Helena, em São Paulo, aproxima-se, com o tempo, de renomados artistas, como Ernestina Karman, com quem inicia pesquisas no mundo das artes; Meiga, quando jovem estudante no Instituto de Educação, em Belo Horizonte, toma aulas de pinturas com o mestre Guignard, no Parque Municipal.

 

Meiga, sempre gostou de escrever e de desenhar. Ainda muito jovem, restaurou os doze quadros da Via Sacra que decoram a Igreja matriz de Muzambinho. Seus quadros costumavam enfeitar os arcos floridos de bambus sobre ruas atapetadas com muitos de seus desenhos, durante as procissões de Corpus Christi. Em 1953, casou-se com João Marque de Vasconcellos, ele também dedicado ao ofício de ensinar, com quem teve nove filhos. Muitos dos textos e pinturas dessa primeira fase da vida de Meiga, em Muzambinho, acabaram por se perder. Em 1971 a família mudou-se para Belo Horizonte, onde tem início a fase mais produtiva de sua vida artística.

 

Meiga é uma grande contadora de histórias. Conta histórias ao escrever e ao pintar. Seus livros são dotados de tal colorido e intensidade narrativa que convidam o leitor a enxergar personagens, ambientes, acontecidos. Seus quadros convidam os olhos a imaginarem uma história, tal a riqueza e profusão de cores, formas, detalhes. Helena, por sua vez, é uma artista multidimensional, rebelde, inquieta, não sujeita a cânones e convenções, dotada de enorme capacidade criativa e capaz de inovar, alçando belos e surpreendentes voos solos.

 

Já em meados da década de 1970 preocupava-se em denunciar os riscos da sociedade de consumo e a consequente degradação ambiental, como em um trabalho realizado na rampa da XIV Bienal Internacional de São Paulo, em 1977. Segundo Mário Shenberg, conhecido físico e crítico literário, os trabalhos de Helena poderiam ser inseridos no contexto de “arte catastrófica e de arte ecológica”. No início da mesma década, Mário Shenberg, em São Paulo, trava contato com algumas das pinturas de Meiga. Schenberg elogia a limpidez das cores, o elaborado senso de detalhe, a requintada singeleza das imagens, fortemente enraizadas na cultura local. A vida quotidiana, as brincadeiras de criança, os costumes, as tradições, as festividades populares, as histórias da terra são recriadas e imortalizadas em sua obra.

 

Helena deixou cerca de 20 livros publicados. Alguns deles, pequenas obras de arte, onde a artista associa palavras, imagens e novos materiais de edição. Em1998, seu livro Pedra D’Ara foi contemplado com o prêmio APCA “Melhor livro de Poesia”. Helena foi uma estrela especial. Após sua partida, em 2014, suas obras continuam a iluminar a terra. Meiga é um facho abençoado de luz. Reside hoje em Belo Horizonte com seu marido, rodeada por filhos, netos, bisnetos, parentes e amigos. Possui cerca de 10 livros publicados , a maioria voltados para o público infanto-juvenil, para “as crianças de todas as idades”, segundo João Marques grande incentivador. Seu livro Quem Viu uma Sereia encantou muitas gerações de crianças país afora, foi exposto na Feira Internacional de Bologna/ Itália, superando a marca de cem mil exemplares publicados.

 

Na semana em que se comemora o aniversário de nascimento da Imortal Helena Armond, Meiga a homenageia e cumprimenta a AFESMIL pelo magnífico trabalho de união, resgate e valorização das escritores de origem sul-mineira. Eu me associa aos cumprimentos e tenho o prazer de homenagear Helena e Meiga. Somos, as três, filhas de Muzambinho.

 

* Glaucia Maria Vasconcellos Vale é escritora, filha de Meiga e João Marques.